sexta-feira, 3 de julho de 2009

28.06

"O sexo é o consolo que a gente tem
quando o amor não nos alcança."


Gabriel García Márquez

Eu nunca fui de acreditar nas armadilhas providas pela internet. Sempre fiz um favor a mim mesmo de manter meu coração afastado, protegido da frieza do contato virtual, com medo de ele ser despedaçado por falsas demonstrações de sentimentos. Mas quando avistei seu rosto na minha página de Orkut com um simpático pedido de adição, confesso que não resisti. Não tenho o costume de aceitar pessoas que não conheço, mas alguma coisa me dizia que devia aceitá-lo. Foi uma sorte ter dessa vez seguido meus impulsos ao invés dos meus preceitos sobre o convívio sócio-virtual.

Empenhamo-nos em nos conhecer um pouco melhor nos dias que se seguiram e, após ouvir sua voz ao telefone, já sabia que seria impossível conter minha mania estúpida de envolver sentimentalismo infantil aos relacionamentos que sequer existiam ainda.Entretanto, dessa vez havia uma certa reciprocidade - do qual eu duvidei enquanto pude, no intuito de manter meu já inerente pessimismo - e marcamos de finalmente nos ver no dia 28 de Junho.

Seus olhos me perfuraram veementemente assim que entrei no carro, com um tênue paradoxo entre inocência e libertinagem. Perderam-se em mim por alguns constrangedores segundos, analisaram cada centímetro do meu corpo lânguido, cada imperfeição do meu rosto assimétrico, e surpreenderam minhas expressões faciais discrepantes que iam de nervosismo crônico ao total regozijo por estar vivendo uma manhã utópica. Meus sentidos também preocuparam-se em tornar físico o que era apenas fotografia
até a alguns instantes atrás e um contentamento exuberante me preencheu ao perceber o quão verossímil eram seus traços firmes, suas extremidades brutas, suas delicadas marcas expressivas, seu sorriso convincente e persuasivo e seus olhos enigmáticos e convidativos. Ele não era uma materialização dos desejos incógnitos da minha mente. Ele era real.

Ele me ensinou a arte da invisibilidade. Fomos transportados para um mundo só nosso, um golpe de mestre nas proibições sociais - ou um soco na cara do preconceito descomedido. E eu não preciso me esforçar muito para reaver dos recônditos da minha mente cada minucioso detalhe daquelas muitas horas que passamos juntos: sinto o cheiro da sua pele alva impregnado em minhas narinas, o som da sua voz ressonante costurando-se com as batidas eletrônicas vindas do rádio e o seu gosto ainda está alocado em cada milímetro das minhas glândulas gustativas.

E então, quando o negrume da noite já havia pintado o céu acinzentado de inverno, nos despedimos com a incerteza nos rodeando como um animal silvestre faminto. Senti pela última vez seus braços me guardarem próximo ao seu corpo e entrei no ônibus com um vazio se encaixando devagarinho sobre meu abdômen. No dia seguinte, era notável o brilho enigmático nos meus olhos, tanto que foi um comentário quase unânime entre meus amigos. E mesmo que não voltemos a nos ver, mesmo que tenha sido apenas uma tarde, eu nunca me esquecerei que você foi a primeira pessoa a fazer meus olhos brilharem dessa forma.

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